Vai passar

A Escola de Samba Acadêmicos do Sul da Ilha apresentou recentemente a Logomarca Oficial e a Sinopse do enredo para o Carnaval 2020. Inspirada em "Vai passar", canção de Chico Buarque, a agremiação quer transformar a avenida em uma grande manifestação de culturas populares. A sinopse é de Willian Tadeu e a logo foi elaborada por Daiane Machado. O desfile será assinado pelo carnavalesco Renan Paskuau. Veja a sinopse:

O ESTANDARTE DO SANATÓRIO GERAL VAI PASSAR
  
As ruas e avenidas hoje cobertas pelo asfalto da modernidade já foram de paralelepípedo e barro. São os caminhos por onde passamos nos descaminhos de nossas vidas, na busca incessante por prosseguir sem nunca chegar, feito penitentes de uma fé que não é nossa. Ainda sentimos pelo chão nossos pés alcançarem a essência das velhas pedras. São as raízes de nossa história, passagens a serem reavivadas na memória de nossas novas gerações.

Estalaram sobre nossos lombos as chibatas da opressão. Somos a pele dura, a casca grossa do tempo, a cicatriz que se tornou escudo. Marcados por um profundo processo de exploração, sujeitos a um senhorio de uma distinção social insana. Escravos e senhores de engenho, eleitores e políticos, empregados e patrões. Acorrentamos reis e rainhas de outras terras enquanto para enriquecer nossas cortes corruptas. 

Erguendo estranhas catedrais, construindo um país à face do outro. Vivemos pelo cabresto daqueles que querem nos reformar. Nos caminhos da vida, negam a nós a luz no fim do túnel.

Ah, Pátria Mãe! Tão distraída estavas, adormecida em berço esplêndido, subtraíram teus tesouros em tenebrosas transações. Da madeira tinturial avermelhada que deu nome ao Brasil, pouco restou. De ponta a outra do litoral, ceifaram o verde da Mata Atlântica e destruíram seringais com portentosas construções. Nossas riquezas cruzaram o mar, nosso ouro enriqueceu o Velho Continente. Tantos nobres e cortes usurparam a grandeza de um povo! Paramos de sustentar um rei com nosso trabalho, vieram outros poderosos com suas maracutaias. 

Quando ousaram sugerir dividir a terra, uma Ditadura assassina se fez, calando oposições e praticando suas próprias corrupções.

A fuga da realidade é o escape da insanidade. É a alegria fugaz que forja nossa resistência. Dos festejos de coroação de reis negros à Parada Gay que é respondida com a marcha dos conservadores para o mártir da cruz. Somos o pensador descolado desfilando de tanga de crochê. Somos os caras-pintadas da justiça seletiva. Damos votos de confiança ao pastor que cantarola a louvação ao rei negro enquanto compõe elogios ao chute em Nossa Senhora. Querem tirar de nós até o direito à rua! A contradição é nossa essência.

E, assim, neste turbilhão insano de nossas vidas, temos direito a estas alegrias fugazes. Entre elas, é claro, o carnaval, nosso carnaval. Onde o faminto se veste de barão, o retinto se veste de Napoleão e todos viramos pigmeus do Boulevard. Faremos da avenida o grande cortejo carnavalesco de nossa história, soltando o grito de consciência que tentam sufocar. É a evolução da liberdade até o dia clarear!

Ou até o eclipse da intolerância apagar as luzes...

Ai, que vida boa, olerê!
Ai, que vida boa, olará!
O estandarte do Sanatório Geral vai passar!




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